Religiões e o meio ambiente - Instituto Brasileiro de Sustentabilidade - INBS

Religiões e meio ambiente

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A questão ambiental e a sustentabilidade nunca antes receberam tamanha importância como atualmente. Isso não significa dizer que a abordagem atual é satisfatória. Estamos apenas no começo de um processo de mudança sócio-econômica que, a cada dia que passa, se demonstra inevitável e cogente. No presente artigo, abordaremos como o meio ambiente e a relação humana é encarada por algumas religiões do mundo.

A preocupação com os rumos tomados pela humanidade em relação a sua forma de relação e exploração econômica do meio ambiente tem se intensificado gradativamente, fazendo com que um número cada vez maior de defensores do desenvolvimento sustentável se manifeste.

A busca por uma sociedade e economia efetivamente sustentáveis se estampa em diversos campos do cotidiano, das organizações não governamentais e seus diferentes âmbitos de atuação – local, regional, nacional ou internacional – às políticas e filosofias corporativas voltadas ao “verde”, passando por programas públicos destinados a minimizar os impactos da ação humana sobre o planeta.

Todavia, recentemente, o movimento ecológico se viu respaldado em um novo universo, no qual, até então, possuía uma abordagem relativamente fraca: A religião, mais precisamente, as monoteístas.

O Catolicismo

Há poucas semanas o Papa Francisco apresentou ao mundo sua primeira encíclica totalmente dedicada ao meio ambiente, denominada “Laudato si – Sobre o cuidado da casa comum”.

No documento, o pontífice cobra uma rápida mobilização dos líderes globais com o objetivo de evitar uma catástrofe natural, pugnando pelo fim da sociedade de consumo, chamada por ele de “cultura do consumo descartável”. Apresenta sérias preocupações com a degradação ambiental e o aquecimento global, apoiando de forma taxativa cientistas que defendem a elevação do clima nos últimos anos como decorrência da ação humana, afirmando ainda serem os países pobres aqueles que mais sofrem e que mais são vitimados.

“A humanidade é chamada a reconhecer a necessidade de mudanças de estilo de vida, produção e consumo, a fim de combater este aquecimento ou, pelo menos, as causas humanas que o produzem ou agravam (…) Chegou a hora de aceitar crescer menos em algumas partes do mundo, disponibilizando recursos para outras partes poderem crescer de forma saudável (…) Hoje, tudo o que é frágil, como o ambiente, está indefeso em relação aos interesses do mercado divinizado, transformado em regra absoluta”, afirma.

O papa informa não acreditar na tecnologia como a solução para todos os problemas sócias, baseados no crescimento e no lucro. “Uma vez mais, temos de rejeitar uma concepção mágica de mercado, que sugere que problemas possam ser resolvidos simplesmente por meio de um aumento nos lucros de empresas ou indivíduos”.

E continua: “A convicção de que tudo está estreitamente interligado no mundo, a crítica do paradigma que deriva da tecnologia, a busca de outras maneiras de entender a economia e o progresso, o valor próprio de cada criatura, o sentido humano da ecologia, a grave responsabilidade da política, a cultura do descartável e a proposta de um novo estilo de vida são os eixos desta encíclica, inspirada na sensibilidade ecológica de Francisco de Assis”.

O texto apresenta ainda a necessidade urgente pelo fim do consumo de combustíveis fósseis em benefício das energias renováveis, deixando clara a preocupação de Francisco com a água, a qual, segundo ele, não pode se tornar um bem privado. “Enquanto se deteriora constantemente a qualidade da água disponível, em alguns lugares avança a tendência para privatizar este recurso escasso, convertido numa mercadoria que se regula pelas leis do mercado.”

O líder da Igreja Católica refere-se ainda aos “pulmões do planeta”, repletos de biodiversidade, como a Amazônia, a bacia hidrográfica do Congo e outros grandes rios ou os glaciares, todos eles lugares importantes para “todo o planeta e para o futuro da humanidade”.

Tal posicionamento gerou críticas por parte de algumas pessoas, principalmente políticos norte-americanos, todavia teve grande aceitação e foi amplamente elogiada em diversos âmbitos sociais, inclusive científico, dada a veracidade e a urgência dos temas abordados.

A Declaração Islâmica Sobre o Clima

De forma quase que contemporânea à encíclica papal, o mundo islâmico se viu representado por seus líderes em Istambul, Turquia, em um simpósio onde se elaborou a Declaração Islâmica Sobre o Clima, vista como uma das maiores contribuições para as conversações sobre o clima a ser realizada em Paris, pela ONU, no fim do ano.

Estudiosos de todo o planeta endossaram a declaração, chamando as nações para a redução das emissões de gases de efeito estufa e um maior uso das energias renováveis. O documento apresenta os motivos pelos quais os muçulmanos devem se preocupar com o meio ambiente e realiza exigências junto aos líderes mundiais governamentais e empresariais.

Solicita aos responsáveis pelo evento da ONU, em dezembro próximo, o estabelecimento de conclusões equitativas e vinculantes – sobre a questão climática. O acordo, segundo a declaração, deve determinar de forma clara as metas e os meios para monitorar seu cumprimento.

O texto afirma ainda que as nações ricas e os países produtores de petróleo busquem eliminar gradativamente suas emissões de gases de efeito estufa até o meio do século, investindo em um modelo de economia verde, abandonando o lucro proveniente da exploração irresponsável (leia-se não ética) do meio ambiente.

Conclama a população e seus líderes a buscarem a adoção do uso de cem por cento de energias renováveis e adotarem, como objetivo estratégico, a emissão zero o quanto antes, reconhecendo que o crescimento ilimitado da economia não é uma opção viável.

A declaração, finalmente, volta seu conteúdo ao setor privado – empresarial, industrial e dos negócios – informando que este deveria assumir um papel mais incisivo e proativo na redução de suas pegadas de carbono, se dedicando também ao uso de cem por cento de energias renováveis e à redução das emissões de gases nocivos ao meio ambiente, investindo em energias renováveis, adotando um modelo de negócios mais sustentável, abandonando, assim, a utilização de combustíveis fósseis.

Encerra com um apelo a “todos os muçulmanos onde quer que estejam” – incluindo a mídia, educação, mesquitas e delegações da ONU.

A questão da influência direta que o documento pode exercer sobre seus fiéis é analisada como não sendo tão incisiva quanto a encíclica papal, uma vez que no Islamismo não há uma autoridade suprema capaz de emanar documentos informativos, orientadores ou que ditem determinadas formas de agir.

As conteúdo elaborado e apresentado funciona, em última instância, como um instrumento capaz de aproximar a população islâmica da consciência acerca da importância ambiental para a humanidade e o dever de sua preservação, demonstrando também a estreita ligação entre a religião e as práticas pró-ambiente, sendo estas últimas, na verdade, decorrência de muitos mandamentos daquela.

Algumas nações muçulmanas asiáticas, como Bangladesh, e outras ao norte da África possuem extremas vulnerabilidades aos impactos das mudança climática. Outras, por sua vez, como a Arábia Saudita e o Iraque, possuem suas economias baseadas na produção, consumo e comércio de combustíveis fósseis, principalmente o petróleo.

O Judaísmo e o meio ambiente

Embora o mundo religioso judaico não tenha emitido de forma uníssona algum manifesto com vistas à questão ambiental, como ocorreu com os católicos e muçulmanos, a presença de uma corrente interpretativa pró-ambiente sobre as escrituras judaicas é inegável.

Segundo o Rabino Norman Lamm, presidente por um longo período da Universidade de Yeshiva, em seu livro “Fé e Dúvida”, no capítulo “Ecologia na Lei Judaica e Teologia”, o Judaísmo, em vários aspectos, possuí os valores sobre os quais a moralidade ecológica pode ser fundada.

O professor de biologia da Universidade de Rutgers David Ehrenfeld e o Rabino Philip J. Bentley escreveram que “há hoje no Judaísmo uma série de regras de confraternização estabelecendo responsabilidades específicas da humanidade em relação aos recursos naturais, animais e outras partes da natureza”. Segundo ambos, a primeira destas regras é o mandamento do bal tashhit, que informa genericamente a obrigação de “não destruir”, obrigação esta interpretada pelos rabinos de forma ampla, chegando, inclusive, a um viés ambiental. Ou seja, determinando ser transgressões aos mandamentos deixar de fornecer água às plantas, a caça esportiva de animais, a extinção de espécies, a destruição de variedades de plantas, a poluição da água e do ar, o consumo excessivo das coisas e o desperdício de recursos minerais e de outras fontes. Concluem afirmando que o Judaísmo foi uma das primeiras grandes religiões ambientais do mundo.

Os rabinos encontram as implicações práticas do Judaísmo em relação ao meio ambiente em parte através de suas interpretações do bal tashhit, considerando a premissa “você não deve destruir desenfreadamente” como um dos 613 mandamentos que os judeus estão obrigados a observar.

Uma dos mais apropriados princípios que perfeitamente coaduna com a atual filosofia da sustentabilidade pode ser encontrado no Shulkhan Arukh, uma compilação da lei judaica do século XVI, de grandioso valor para os judeus. “É proibido destruir ou ferir qualquer coisa capaz de ser útil para os homens”, informa o texto. Trata-se de uma clara semelhança principiológica com a definição atual de desenvolvimento sustentável: aquele que busca satisfazer as necessidades da atual geração sem comprometer a satisfação das necessidades das futuras.

Algumas dificuldades encontradas por muitas pessoas quando analisam os mandamentos judaicos estão na interpretação restritiva de determinadas passagens e nas errôneas ou pobres traduções dos textos originais para outras línguas.

Segundo Karl Grossman, professor da Universidade Estadual de Nova Iorque, um problema chave para se compreender a abordagem do Judaísmo sobre o meio ambiente, que ocorre também no Cristianismo, envolve a tradução duvidosa de uma palavra no livro de Gênesis, ao informar o que disse Deus: “Sede fecundos, multiplicai-vos e enchei a terra e sujeitai-a; e dominai os peixes do mar e as aves do ar”.

Estudiosos informam que a palavra “domínio” como sendo a tradução para yirdu se trata de um erro, ou no mínimo uma tradução pobre, possuindo originalmente um contexto muito mais amplo que apenas a dominação destrutiva. Informam que não há evidências que essas frases do livro de Gênesis foram sempre interpretadas como uma licença para a irresponsável exploração ambiental por parte dos rabinos. Dizem ainda que tal interpretação vai contra os ensinamentos e a espiritualidade e citam inúmeras passagens bíblicas que informam ser Deus o proprietário do mundo e o homem o zelador do planeta.

Na fé judaica midrash é a interpretação, a exegese, de suas leis sagradas. Em uma delas, Midrash Kohelet Rabbah, 1 sobre Eclesiastes 7:13, pode-se ler: “Quando Deus criou os primeiros seres humanos, levou-os ao redor do Jardim do Éden e disse: ‘Olhem para meus trabalhos! Vejam como eles são lindos! Para o seu bem eu criei todos eles. Você não deve estragar ou destruir meu mundo, pois se o fizer, não haverá ninguém para consertá-lo.’”

Quando observamos as fortes manifestações pró-ambiente nas três principais religiões monoteístas do mundo fica evidente, por seu grande número de fiéis e seguidores, o gigante poder de mobilização social em prol da consciência ambiental.

O Catolicismo possuí, segundo dados do Vaticano, em torno de 1,2 bilhão de fieis, tendo sua principal concentração, em torno de 40%, na América Latina. Já o Islamismo detém em torno de 1,6 bilhão de devotos, sendo sua maior concentração na Ásia e Oceania. O Judaísmo possuí um número inferior de seguidores, girando em torno de 14 milhões, embora exerça grande influência no mundo.

Assim, os três segmentos religiosos congregam em torno de 2,814 bilhões de fiéis em todo o globo, os quais exercem importantíssimo impacto sobre a economia e o meio ambiente na atualidade.

Referências:

SYMPOSIUM, International Islamic Climate Change. Islamic Declaration on Global Climate Change. Disponível em: <http://islamicclimatedeclaration.org/islamic-declaration-on-global-climate-change> Acesso em: Setembro de 2015.

FRACISCO, Papa. Laudato si – Sobre o cuidado da casa comum. Disponível em: <http://w2.vatican.va/content/francesco/pt/encyclicals/documents/papa-francesco_20150524_enciclica-laudato-si.html> Acesso em: Setembro de 2015.

GROSSMAN, Karl. Judaism and the Pope’s Encyclical on the Environment. Disponível em: <http://blogs.timesofisrael.com/judaism-and-the-popes-encyclical-on-the-environment/> Acesso em: Setembro de 2015.

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